Vila Real vai vestir-se a rigor já no
próximo fim-de-semana, com a chegada do Campeonato de Portugal de Montanha JC
Group 2020. Nos dias 7 e 8 de março, as famosas curvas de Murça vão ter
honras de abertura da nova época de competição, que se apresenta com algumas
alterações regulamentares importantes e com mudanças significativas de
calendário. Este ano, e pela primeira vez, a Rampa Porca de Murça conta com o
maior número de inscritos, onde à habitual festa se vai juntar um veículo
elétrico. «É
o Tesla P100D Electric GT de Ricardo Gomes, cujo motor, com transmissão
integral automática, debita uma potência de 778 cv e necessita de apenas 2,1
segundos para acelerar dos 0 aos 100 km/hora» referiu o CAMI Motosport.
Cobertas de espetáculo e emoções à mistura, as célebres ´Curvas de Murça´
dispensam apresentações. Nascida na década de noventa, então integrada no
Campeonato de Velocidade e troféus monomarca, é uma das mais emblemáticas
provas automobilísticas de Montanha do nosso país. A rampa sofreu um interregno
durante alguns anos, até ser recuperada pelo Clube Aventura do Minho em 2014.
João Fonseca, o campeão absoluto de Montanha em 2019 contou à Federação que
este ano não vai participar na competição. Com a ausência do piloto do Sporting
Clube da Covilhã, quem irá torcer o ´rabo da Porca´ em Murça?
Lendas há muitas, mas Joaquim Teixeira desvendou a verdadeira história.
«A lenda mais popular é que no século VIII esta povoação e o seu nome
eram assolados por grande quantidade de ursos e javalis. Os senhores da Vila,
secundados pelo povo, tantas montarias fizeram que extinguiram tão daninha
fera, ou a escorraçaram para muito longe. Mas, entre esta multidão de
quadrúpedes, havia uma porca (outros dizem ursa) que se tinha tornado o terror
dos povos pela sua monstruosa corpulência, pela sua ferocidade, e por ser tão
matreira que nunca poderia ter sido morta pelos caçadores. Em 775, o Senhor de
Murça, cavaleiro de grande força e não de menor coragem, decidiu matar a porca.
O nome Murça dado à própria vila, vem de algum mouro chamado Muça. Segundo
alguns etimologistas o nome deriva de Ursa, nome antigo que está ligado à lenda
da Porca». Uma lenda, e se para muitos virou tradição, outros, os verdadeiros
crentes, fizeram história. A Porca de Murça tornou-se uma das rampas mais
aclamadas do Campeonato de Portugal de Montanha JC Group, e nem o piloto
transmontano lhe fica indiferente.
Das mais antigas e
bonitas provas da Montanha em Portugal…
Joaquim Belmiro Teixeira, é conhecido na vila como o piloto Presidente. Mas na
sua génese, a vasta experiência que adquiriu ao longo dos anos, vai além do que
é conhecido. Piloto respeitado, promotor da modalidade e presidente da APPAM –
Associação Portuguesa dos Pilotos de Automóveis de Montanha, Joaquim Teixeira é
ainda Técnico Superior da EDP Distribuição e trabalha na área do Ambiente em
Vila Real.
Mas nem sempre foi assim. De tenra idade demonstrou adoração pelos carros, mas
só em idade adulta conseguiu concretizar o sonho. «Comecei já tarde, com 35
anos. Na altura, o dinheiro era escasso e os apoios da família (pais) para o
desporto era zero. No entanto, sempre gostei muito de automóveis, e por isso
comecei nas Perícias. Também durante muitos anos, pela função de comandante que
ocupava nos bombeiros, tinha de estar sempre presente em todas as provas
realizadas em Murça. Mais tarde consegui e nunca mais parei, porque realmente
gosto de o fazer e porque me faz sentir vivo. Considero até que ´quanto mais
rápido ando, maior é a sensação de estar vivo´…».
Para Murça, Joaquim Teixeira já traçou o plano, uma época de excelência que
assinala 25 anos de carreira, onde os seus objetivos continuam altos, assumindo
desde já, que ´volta a entrar no campeonato para vencer´. E o que esperar desta
primeira rampa? «Um ambiente de ansiedade entre pilotos, equipas e público. É a
primeira prova e todos estão ansiosos por voltar a ver a adrenalina do
Campeonato de Portugal de Montanha JC Group 2020. A expetativa para esta prova
é que o número de participantes ultrapasse as quatro dezenas de inscritos».
Cálculos à parte, a primeira missão foi fácil de concretizar, uma vez que a
Rampa de Porca de Murça conta já com uma abonada lista de 55 inscritos. Mas as
novidades não ficam por aqui. Ainda para 2020, em termos regulamentares,
o CPM JC Group tem algumas alterações relevantes. No que respeita a títulos
nacionais, estarão em jogo os títulos Absoluto, Protótipos, GT, Turismos,
Clássicos e ainda de Legends. As antigas Divisões 5 e 6, onde se enquadravam os
concorrentes do Campeonato de Portugal de Clássicos de Montanha, são agora
substituídas em Grupos, distribuídos pelos H65, H71, H75, H81, Gr. 1 e 3
Nacional e GR5. No campeonato reservado aos Legends existirão os Grupos 85, 90,
99, especial, Livre, Feup 2 e Feup 3. No que respeita à Categoria Protótipos,
esta é agora dividida em duas Divisões, A e B, numa busca pela maior equidade
desportiva.
«Tenho a facilidade de
despir a camisola de promotor durante as provas e vestir a de piloto»
Para Joaquim Teixeira, qualquer piloto com licença desportiva pode correr na
Montanha, como o pode fazer em qualquer outra disciplina do automobilismo. Mas
sobre ser um bom piloto, o discurso já é outro. «Não é por ter licença,
conduzir ou ter um carro muito potente que é um bom piloto. Aliás, sou da
opinião que todos deveriam iniciar-se com viaturas limitadas na cilindrada como
antigamente, onde tinham de passar pela iniciação, existindo troféus próprios
para isso».
Experientes ou em fase de aprendizagem, certo é que Murça já homenageou muitos
campeões nacionais de Montanha, uma corrida às bilheteiras que se faz de forma
gratuita, só pelo prazer de assistir ao que me mais espetacular os pilotos
sabem fazer. «As pessoas de Murça gostam de automobilismo, porque Murça é uma
terra de provas de automóveis, num passado curto já teve oito provas nacionais
e internacionais por ano». De acordo com o piloto transmontano, mais do
que a adrenalina de uma corrida, e a emoção que isso ergue no público que a
acompanha, são as muitas histórias que ficam por contar. «Nos primeiros anos,
um piloto de Murça que estava a fazer a prova, capotou na curva dos saltinhos e
o dono do carro só soube quando estava a ver as imagens em direto da prova.
Outra história passou-se comigo. Um ano estava a fazer a prova e em uma das
subidas o mecânico esqueceu-se de apertar as porcas das rodas. Certo é que
nessa subida consegui fazer o melhor tempo do fim-de-semana…».
Homem dos sete ofícios, Joaquim Teixeira tem a vantagem de viver todas as
emoções de uma prova, não só pelas responsabilidades inerentes às suas funções
de promotor, mas pelo gosto de mudar a camisola na hora da partida para mais
uma voltinha. «Tenho a facilidade de despir a camisola de promotor durante as
provas e vestir a de piloto. No entanto, nem sempre se torna fácil porque os
meus colegas não conseguem dissociar as minhas duas funções e muitas vezes em
plena prova colocam-me questões de Presidente da APPAM, que eu deixo de ser
antes do início de cada prova».
Da Covilhã para o
Mundo dos carros – A ausência do piloto Campeão de Montanha para 2020
«Toda a velocidade, adrenalina, espírito de competição, querer sempre mais e
melhorar sempre!
O cheiro da gasolina, dos pneus, o barulho…são coisas que adoramos e fazem
parte de nós!». É desta forma que João Fonseca explica o porquê de se ter apaixonado
pelos carros e não por outro desporto qualquer. Aliás, experimentou e tentou
outras artimanhas, mas os títulos, só os conquistou com a chegada ao
automobilismo, para si, a verdadeira cadeira de sonho.
No Campeonato de Portugal de Montanha JC Group, o piloto da Covilhã foi por
duas vezes campeão absoluto da modalidade (2015 e 2019). Um feito a quem se
orgulha de dedicar ao público da casa. «As duas vitórias na Rampa Serra da
Estrela, minha casa (2015, 2019), com o apoio deste público fantástico, bastante
emocionado! Foi algo maravilhoso sentir o apoio e carinho de tanta gente!».
Em 2019, com sete vitórias em oito provas, João Fonseca confirmou o seu domínio
no Campeonato de Portugal de Montanha JC Group, consagrando o título na Rampa
de Boticas. Por vencer, ficou apenas a Rampa da Porca de Murça, em 2020, prova
inaugural do Campeonato. Por motivos profissionais, o piloto não conseguirá
estar presente esta época, no entanto, deixa uma mensagem aos seus
concorrentes. «A
A Rampa de Murça é das mais técnicas do Campeonato, com muitos
“truques”… é importante trabalhar bem este traçado e preparar bem a
prova».
João Fonseca não sabe o momento exato que se apaixonou pela profissão, sabe
apenas que é algo que nasce connosco. «Lembro-me de assistir à Rampa Serra da
Estrela com o meu pai desde muito cedo. Os mais velhos diziam também que a
única forma de eu parar de chorar em criança era quando me colocavam dentro de
um carro. Talvez tenha sido um sinal».
Em 2020 João Fonseca volta a cumprir um ano sabático, feito que já repetiu no
passado, e embora o foco seja a preparação para 2021, o piloto deixa uma
certeza – a presença na Rampa da Serra da Estrela, um dos motivos pelos quais
se tornou piloto.
Hélder Silva – Um
segundo lugar que espreita a liderança do Campeonato
Na época passada, assistiu-se nas famosas ´Curvas de Murça´, a um verdadeiro
duelo de titãs, com Hélder Silva e José Correia a aproveitarem da melhor forma
os problemas mecânicos ocorridos no Silver Car EF10 de João Fonseca. E se o
último se sagrou campeão absoluto, Hélder Silva agarrou o segundo lugar,
conseguindo aquilo que faltou ao piloto da Covilhã – a vitória em Murça,
precisamente o destino inaugural do Campeonato de Portugal de Montanha JC Group
para 2020. Questionado sobre as expetativas para a nova época, Hélder Silva só
tem uma certeza: «o meu objetivo é lutar pelo primeiro lugar no campeonato».
Desde pequeno que gosta de tudo que tenha rodas e motor. Uma paixão alimentada
pelo sonho e pela ânsia de ir mais longe. Para 2020, o Campeonato de Portugal
de Montanha está recheado de novidades, mas Murça tem um particular encanto
para o piloto. «É uma rampa especial, por ter sido a primeira em que fui
vencedor absoluto». Hélder Silva não tem amuletos da sorte. O truque para ser
vencedor? «Apenas dar o litro». Um pódio que, desta vez, não pretende deixar
escapar. Em Murça, Hélder Silva vai reforçar o seu potencial competitivo com a
aquisição do BRC BR53 que permitiu ao asturiano Javier Villa sagrar-se pela
sexta vez campeão espanhol de montanha.