Foi a corrida mais disputada do ano e não faltavam motivos para que isso acontecesse. Nesta 35ª edição da Baja Portalegre 500 estavam em jogo os títulos mundial e europeu de bajas, assim como alguns dos portugueses. Para os candidatos aos diferentes títulos, a presença em Portalegre era, obviamente, obrigatória, mas o certo é que o plantel foi bastante reforçado por ‘outsiders’, que somente ambicionavam correr conseguir o melhor resultado. E se atendêssemos ao valor das viaturas, à partida havia uma boa dúzia e meia com condições de discutir a primazia. Mas, afinal, a luta pela vitória foi um emocionante duelo de grandes campeões, opondo a Toyota Hilux dos portugueses Tiago Reis e Valter Cardoso ao Mini dos polacos Krzystof Holowczyc e Lukasz Kurzeja.
Ano após ano e já lá vão 35 sem conhecer um interregno, Portalegre acolhe aquela que é a mais importante competição de todo terreno portuguesa. Não só por ter sido realmente a primeira, mas simplesmente porque foi evoluindo ao longo dos anos e conquistando o mundo, ao integrar o calendário das competições mais relevantes, nomeadamente as da FIA. A sua posição tardia no calendário inúmeras vezes fez da Baja Portalegre 500 a prova decisiva. Todos os grandes nomes desta disciplina já correram em Portalegre, como se nenhum fosse um piloto completo sem ter vindo à capital do Alto Alentejo, para conduzir nas suas pistas, tantas vezes estreitas e sinuosas, entre sobreiros.
Todos os anos, organizam-se autênticas caravanas para acompanhar a prova, montando-se animados acampamentos ao longo do percurso, faça chuva ou faça sol. Mais do que isso: a Baja Portalegre 500 é desde há muito o maior cartaz de animação desta região. A invasão de forasteiros gera oportunidades de negócio imperdíveis, mas a própria economia local é movida pelo consumo generosos dos seus próprios habitantes, que nestes dias de festa se mostram sempre mais disponíveis para celebrar este acontecimento.
Mas, nada disto aconteceria se não fosse a férrea vontade de uma vasta organização. ‘Herdando’ a Baja Portalegre 500 do seu criador, o Clube Aventura, originalmente de José Megre e Pedro Villas-Boas, o ACP Motorport continua a honrar o fantástico legado dos pioneiros e se o próprio presidente do clube, Carlos Barbosa, foi também um dos pioneiros, mas como participante, a verdade é que na estrutura da organização ainda prevalecem alguns elementos desses vibrantes anos de arranque. E dois deles são homens que não podemos deixar de mencionar especialmente: Jaime Santos e Orlando Romana, que entraram para a equipa ainda jovens e hoje são reconhecidos internacionalmente pela competência do trabalho que desenvolvem. Procurar os caminhos mais adequados para desenhar uma prova destas é apenas uma das missões. Mas a mais importante é a capacidade que têm de agregar à sua volta toda a imensa equipa de colaboradores, sem os quais nada do que fazem seria possível de concretizar-se. Falamos de largas centenas de entusiastas que durante estes dias, sempre no final de Outubro, vestem, literalmente, a camisola da Baja Portalegre 500, para que todos os outros possam festejar a grande corrida fora da estrada.
Depois de termos acompanhado mais esta edição, assistindo a múltiplas passagens de todos os concorrentes, ou quase, durante um par de dias, como sempre fizemos desde 1987, demos connosco a pensar que esta foi uma das edições que mais prazer nos deu de testemunhar. Não foi, de modo algum, a que fez desfilar o plantel mais notável, mas o equilíbrio entre os participantes foi tal que não conseguimos desviar o olhar dos caminhos, sempre que passava mais um carro. E dizemos carro porque, na verdade, concentrámo-nos numa única corrida, que até foram três: a prova dos automóveis, dividida na competição FIA, na competição nacional e ainda na corrida, ligeiramente mais reduzida, da Taça de Portugal. É nesta que correm os carros mais velhos; mas que não haja equívocos, porque isso está longe de significar que sejam os mais lentos. Aliás, esse papel foi este ano singularmente protagonizado por um veterano – chamar-lhe ancião não nos parece inadequado – que os 76 anos quis dar-se ao luxo de voltar a competir, mas ao volante de uma das melhores máquinas do momento: um Mini All4 Racing preparado pela X-Raid, idêntico aos que já venceram em Portalegre algumas vezes, mas que nunca tínhamos visto passar tão vagarosamente. De tal modo, que a dada altura ouvimos um grupo de espectadores comentar entre si, com verdadeira ingenuidade, que ‘este deve ser o carro eléctrico…’ – pois, pelo menos, não fazia barulho quando passava. Oxalá o seu piloto, José Gameiro, se tenha mesmo divertido. Porque nós divertimo-nos imenso a ver todos os concorrentes. E nem o desconforto da chuva nos fez querer trocar a berma dos caminhos por um abrigo…
A estratégia para a vitória: não sair à frente!…
Conhecedor da nossa prova, que já tinha ganho por duas vezes, Holowczyc não se deixou intimidar pela concorrência e usou de uma estratégia que, mesmo longe de inovadora, costuma resultar, sobretudo quando são elevadas as garantias de não encontrarmos os pisos secos e poeirentos. Foi, uma vez mais, o caso da Baja Portalegre 500: durante três dias, desde as verificações à cerimónia final de consagração, pudemos dispensar os casacos, mas nem sempre o guarda-chuva. E com pisos enlameados, é sempre uma desvantagem partir à frente e ir ‘limpando’ o caminho. Ora foi exactamente nisso que pensou Krzystof Holowczyc, que depois de vencer sector de qualificação – como agora se designou o tradicional prólogo – escolheu ser o quarto a partir para o segundo sector selectivo, garantindo que não iria ter à sua frente nenhum piloto lento que o pudesse ‘travar’, mas sim três perfeitos ‘varredores’ que, inevitavelmente, se encarregariam de marcar no chão o ponto onde passaram, deixando até que um olhar mais experiente, como o seu, pudesse perceber onde travavam.
Alejandro Martins e José Marques, que tinham sido os melhores portugueses no prólogo, também podiam ter escolhido não sair à frente para os 65,55 quilómetros do segundo sector selectivo, mas ao apostarem arrancar à cabeça da caravana, fizeram até um óptimo favor a Tiago Reis e Valter Cardoso, que os seguiram à saída do mais curto dos três sectores selectivos, em Ponte de Sôr. E demonstrando o quanto válida é a receita de Holowczyc, Tiago Reis, que partiu logo a seguir ao Mini de Alejandro Martins, não surpreendeu nem os adversários estrangeiros mais fortes ao ganhar o troço e instalar-se no comando por mais de meio minuto de avanço, seguido de perto apenas por mais outra Toyota Hilux portuguesa, a de João Ramos e Filipe Palmeiro. Depois, vinham os Mini John Cooper Works Rally de Holowczyc, a 38,4 segundos, e de Alejandro Martins e José Marques, com mais dois minutos e quatro segundos que o comandante, atraso que, de certo modo, reflectia terem cumprido a segunda parte do troço sem limpa pára-brisas. Convém acrescentar que a chuva começou a cair precisamente no momento em que o sector se iniciou, não voltando a cessar senão à noite. Mas pior do que este problema, que se resolveu no parque de assistência, em Portalegre, foi o mau funcionamento do motor, que se revelou já na ligação para o final da etapa. E nem a presença de engenheiros da X-Raid chegou para que isso se resolvesse, o que levou Alejandro Martins a optar por não partir para a segunda etapa, convicto de que o motor não lhe permitiria ir longe. Pelo menos, evitou danos mais graves…
Mas ao sair em primeiro na manhã de sábado, Tiago Reis imediatamente percebeu que seria difícil manter a primazia. Precisamente por estar a abrir o caminho. Sem surpresa, após os 146,24 quilómetros do terceiro sector selectivo, a diferença entre o Mini John Cooper Works Rally de Holowczyc e a Toyota Hilux de Tiago Reis cifrou-se em cinco minutos e 12 segundos – cerca de dois segundos por quilómetro – que bastaram para que o piloto polaco tivesse recuperado a liderança, passando a dispor de uns ‘confortáveis’ três minutos e 33,3 segundos de vantagem. Se recordarmos que no segundo sector selectivo Holowczyc tinha concedido 1,4 segundos por quilómetro para o novo Campeão de Portugal de Todo Terreno, esta diferença deixa de parecer abismal. Aliás, bastava fazer contas para perceber que a discussão pela vitória estava longe de arrumada, pois partir em primeiro lugar para o derradeiro sector selectivo era agora mais vantajoso do que o contrário, pois neste caso o percurso estava perfeitamente bem marcado pela passagem anterior dos SSV, que abriram sulcos em todas as curvas mais lentas, como que desenhando os sinais que no penúltimo troço faltaram a Tiago Reis.
Todavia, o desafio implicava aumentar ainda mais o ritmo, pois para que as primeiras posições se invertessem, Tiago Reis tinha de ser mais rápido 1,1 segundo por quilómetro que o novo comandante e já tinha demonstrado que conseguia uma vantagem ainda maior.
Mas Krzysztof Holowczyc estava determinado a não ceder e embora à chegada tivesse declarado que tinha recebido instruções do director da equipa X-Raid para não correr riscos que pudessem comprometer a sua posição, o certo é terá aliviado mais o pé no travão que no acelerador, tal como fez Tiago Reis, que andou o mais depressa que pôde e venceu o troço final, mas somente se adiantou 0,7 segundos por quilómetro ao Mini.
A vantagem que definiu a vitória nesta 35ª Baja Portalegre 500 foi de apenas um minuto e 14,6 segundos; ora, depois de percorridos 410,06 quilómetros cronometrados, Tiago Reis perdeu para o vencedor da prova – e também da Taça da Europa FIA de Bajas – em média seis quilómetros por segundo. E perder assim não é nenhuma vergonha. Tal como ganhar depois de um duelo assim é sempre uma grande vitória. Curiosamente, esta foi a terceira participação de Krzysztof Holowczyc na Baja Portalegre 500 e em todas elas o piloto veio em busca de um título internacional, que dependia da vitória nesta prova para ser conquistado. Venceu em 2010 por uma vantagem de oito minutos e 33 segundos ao volante de uma Nissan Navara Overdrive, navegado pelo próprio dono da Overdrive, o belga Jean-Marc Fortin – que uns anos antes já tinha sido seu navegador em ralis – e conquistou a Taça do Mundo FIA de Bajas. Regressou em 2013 já com a equipa X-Raid, com um Mini All4 Racing e o alemão Andreas Shulz como navegador, impondo-se por apenas um minuto e 20 segundos e assegurando com este triunfo a Taça do Mundo de Ralis de Todo Terreno.
Além de ter conquistado fama na Polónia como piloto de ralis, Holowczyc tornou-se ainda mais célebre como apresentador de televisão e chegou mesmo a enveredar, durante breve tempo, por uma carreira política, que entre 2007 e 2009 o levou a representar o seu País no Parlamento Europeu. Esta terceira vitória em Portalegre, tendo ao seu lado o compatriota Lukasz Kurzeja, foi não só a mais discutida, como a que foi obtida pela menor diferença final: um minuto e 14,6 segundos, recordamos, ou seja, menos 5,4 segundos do que em 2013. Desta feita, Holowczyc consagrou-se vencedor da Taça Europeia FIA de Bajas por apenas 1,5 pontos de vantagem sobre o saudita Yazeed Al-Rajhi que, por sua vez, foi recompensado com o titulo da Taça do Mundo FIA de Bajas por uma vantagem de 9,5 pontos sobre Yasir Seaidan, também da Arábia Saudita. A presença em Portalegre foi negativa para os dois árabes: Al-Rajhi começou por assegurar o segundo posto no prólogo, mas já completou a primeira etapa em quinto e na segunda jornada chegou a cair para o 13º lugar, conseguindo recuperar no último sector selectivo, para levar a sua Toyota Hilux ao décimo posto absoluto, imediatamente à frente do Mini John Cooper Works Rally do seu compatriota; a Yazeed Al-Rajhi bastava-lhe ter sido oitavo à chegada para ter batido Krzysztof Holowczyc exactamente pela mesma diferença com que perdeu o título europeu: 1,5 pontos. Quanto a Yasir Seaidan, somente no sector final conseguiu ser mais rápido que Al-Rajhi, mas ao terminar no 11º lugar nem sequer pontuou e para vencer o duelo pela Taça do Mundo FIA de Bajas precisaria de ter ficado pelo menos cinco lugares à frente do seu adversário, pois isso valia-lhe 10 pontos, contra apenas um do 10º lugar de Yazeed Al-Rajhi . Neste cenário, Seaidan teria sido ‘campeão’ por apenas meio ponto de vantagem!…
Nono classificados em termos absolutos, terminando exactamente à frente dos dois pilotos sauditas, foram Alexandre e João Pedro Ré. Os dois irmãos, uma vez mais, dominaram por completo a classificação reservada ao grupo T4, desta vez mais participada que o costume: reuniram-se 14 equipas à partida e somente duas não conseguiram chegar ao controlo final. Os Ré, que para a história ficam como os primeiros a ganhar uma competição em termos absolutos com um destes veículos ‘ligeiros’, como a FIA os designa, quando chegaram a Portalegre já traziam consigo a certeza da vitória na Taça Europeia FIA de Bajas. Mas a jornada final do calendário ainda tinha um aliciante suplementar: estavam na terceira posição da Taça do Mundo FIA de Bajas, ao nível do grupo T4, e tinham reais possibilidades de somar mais este título. Claro que correrem num cenário com as características tão particulares da Baja Portalegre 500 era desde logo uma importante vantagem face aos dois adversários na luta pelo título mundial, ambos mais habituados aos grandes espaços do deserto, do que a conduzir entre caminhos rodeados por árvores. Dos dois opositores, o kuwaitiano Mshari Althefiri, que ocupava a segunda posição da Taça do Mundo, nem sequer arriscou vir a Portugal, mas o comandante, o saudita Saleh Abdullah Alsaif, não baixou os braços e apresentou-se em Portalegre, não temendo sequer o favoritismo de Alexandre e João Pedro Ré, já que bastava-lhe ser sexto para marcar oito pontos que lhe dariam, pelo menos, uma vantagem final de um ponto, em caso do previsível domínio total dos Ré. Alsaif e Alexandre Ré eram também colegas de equipa, ambos integrados na equipa South Racing, que é de longe a maior dinamizadora das duas novas categorias de veículos ligeiros criada pela FIA – os grupos T3 e T4. Dispondo de material semelhante, os BRP CAN-AM Maverick, o duelo tinha tudo para ser cerrado e os 9,5 segundos de diferença registados no prólogo entre os portugueses e o saudita, desde logo confirmava que as chances de Alsaif regressar a casa com o título mundial eram fortes, pois bastava-lhe manter até final o quarto posto obtido no início.
Todavia, no segundo sector selectivo Alsaif não conseguiu evitar um despiste, embatendo contra um poste, num incidente que lhe arrancou uma das rodas, impedindo-o de terminar o troço. Pôde fazê-lo na segunda etapa, onde começou por assinar o terceiro melhor tempo no terceiro sector selectivo, terminando o último troço como o segundo mais rápido. Os irmãos Ré melhor não podiam ter feito: ganharam tudo o que havia para ganhar. E como a recuperação final de Saleh Abdullah Alsaif e Kirill Shubin não foi suficiente para chegarem ao sexto lugar, quedando-se por um modesto 11º lugar, que lhes rendeu apenas meio ponto, nada puderam fazer para impedir a dupla consagração de Alexandre e João Pedro Ré, que conquistaram o título Mundial por sete pontos de vantagem. Curiosamente, se Alsaif tivesse terminado em sétimo, teria marcado sete pontos, que resultariam num empate com o seu adversário português. Como os dois alcançaram o mesmo número de vitórias durante esta temporada, os três primeiro lugares de cada mantinham o empate, mas Alexandre Ré ganharia por ter dois segundo lugares; e ponto final, pois os portugueses disputaram somente cinco das nove provas da Taça do Mundo, ou seja, as que coincidiram com o calendário da Taça Europeia. E acrescentamos que ao nível do Grupo T4, o título é apenas para o piloto: os navegadores somente marcam pontos para o título absoluto e neste caso João Pedro Ré foi o 11º classificado, com 22 pontos, tantos quantos o seu irmão somou na classificação de pilotos, embora Alexandre tenha ficado no 13º lugar…
Nove portugueses entre os dez mais rápidos
No final desta 35ª Baja Portalegre 500, foram cinco as equipas portuguesas que terminaram entre as dez primeiras classificadas. Mas ao longo de toda a prova, houve nove formações nacionais a ocupar um lugar entre as dez mais rápidas; algumas não conseguiram chegar ao fim, outras não resistiram ao avanço de adversários estrangeiros. Seja como for, todos se destacaram.
Terceiros mais rápidos no sector de qualificação, em Portalegre, Alejandro Martins e José Marques terminaram a primeira etapa na quarta posição, mas os problemas no motor do Mini John Cooper Works Rally, que se revelaram já na ligação final, não puderam ser resolvidos em tempo útil, nas duas horas disponíveis para manutenção, no ‘parque de assistência’. Embora o carro tivesse recolhido ao ‘parque fechado’, não arrancou para a segunda etapa, tornando-se na primeira desistência relevante entre as equipas nacionais.
No final da primeira etapa, a liderança absoluta estava entregue aos portugueses Tiago Reis e Valter Cardoso, seguidos de perto – com uma vantagem de 31,9 segundos – pela dupla João Ramos e Filipe Palmeiro. Na segunda etapa, as duas Toyota Hilux conheceram sortes bem distintas: logo no terceiro sector selectivo, ambos foram ultrapassados pelo Mini de Holowczyc, mas no último troço cronometrado, enquanto Tiago Reis se evidenciou ao voltar a ser o mais rápido, mesmo que não o suficiente para recuperar a liderança, João Ramos perdeu 21 minutos e 40 segundos para o melhor; neste caso, esse atraso implicou descer imenso na classificação, trocando a terceira posição absoluta pelo 12º posto. Problemas com a transmissão, que a dada altura deixaram a Toyota Hilux de João Ramos a funcionar apenas com tracção dianteira, explicam o atraso, que foi um rude castigo para as aspirações de uma das equipas mais aplaudidas pelo público ao longo das duas jornadas…
A segunda posição entre os portugueses coube igualmente a uma Toyota Hilux, entre as 11 preparadas pela Overdrive que estiveram presentes em Portalegre: a de Miguel Barbosa e Pedro Velosa, que regressaram às competições exactamente um ano depois da última participação, em que conquistaram o título de Campeões de Portugal de Todo Terreno. Oitavos no sector de qualificação, foram recuperando uma posição em cada sector selectivo, para no último darem um ‘salto’ a dobrar, ascendendo do sexto ao quarto lugar final, um bónus oferecido pela desistência de Ricardo Porém e Luís Ramalho, que foram outros dos protagonistas nacionais.
Vencedor de quatro edições consecutivas, Ricardo Porém não tinha desta vez a mesma ambição, pois a diferença de competitividade do carro disponibilizado pela Cattiva Sport dificilmente lhe permitiria fazer frente às Toyota e Mini com preparação ‘de fábrica’, como se costuma dizer dos carros que são construídos pelas formações oficiais. Mas Ricardo Porém demonstrou uma vez mais o seu elevado valor ao contrariar esta teoria e na manhã de sábado, surpreendeu todos os adversários ao ser o terceiro mais rápido no terceiro sector selectivo, adiantando-se de tal modo que subiu imediatamente do 12º ao quarto lugar absoluto. Ainda mais impressionante foi a recuperação de Nuno Matos e Joel Lutas, os quartos mais rápidos no terceiro sector selectivo, a apenas cinco segundos de Porém, o que lhes permitiu melhorar uma dúzia de posições: a Fiat Fullback Proto do piloto de Portalegre saiu de casa ocupando o 19º lugar e voltou já em sétimo! Ricardo Porém e Luís Ramalho já não voltariam a Portalegre, desistindo no decurso do último sector selectivo, devido a problemas no motor do protótipo da Cattiva Sport, mas também Nuno Matos e Joel Lutas conheceram problemas na fase final, que condicionaram o andamento da sua pick-up e o seu resultado final…
A quebra de um dos discos de travões, a uma quarentena de quilómetros da chegada obrigou Nuno Matos a adoptar uma condução mais cautelosa, nada podendo fazer para contrariar a ascenção da Volkswagen Amarok de Hélder Oliveira e Carlos Jorge Mendes, não sendo inclusive alcançados pelo Can-Am Maverick dos irmãos Alexandre e João Pedro Ré por escassos 19,4 segundos! Mesmo assim, o desempenho de Nuno Matos e Joel Lutas na segunda etapa desta Baja Portalegre 500 valeu por toda a temporada, destacando-se de uma forma como não tinha acontecido em nenhuma das quatro provas anteriores!
Quanto a Hélder Oliveira e Carlos Jorge Mendes, sétimos classificados em termos absolutos, a opção por correr em Portalegre com a ‘velha’ Volkswagen Amarok da South Racing não lhes permitiu andar tão à frente quanto desejavam. O motor, claramente, não colaborou com esta equipa e por apenas 22,6 segundos não bateram a Toyota Hilux de Marcus Baumgart, com quem travaram um demorado duelo, pois já no final da primeira etapa estavam atrás dos braseiros, com uma diferença de cerca de 12 segundos. À partida para o último troço, a Volkswagen Amarok de Hélder Oliveira estava colocada entre as Toyota Hilux dos irmãos Marcus e Christian Baumgart, com quase meio minuto de atraso sobre o primeiro e 9,6 segundos de avanço sobre o segundo. Nos 197,77 quilómetros do derradeiro sector selectivo, Christian Baumgart destacou-se de ambos e não só foi o terceiro mais rápido, como lhes ganhou cerca de cinco minutos, subindo repentinamente do 10º ao quinto lugar final, ainda que contando com o atraso de João Ramos e o abandono de Ricardo Porém. Aliás, foi também graças a estes dois que quer Alexandre e João Pedro Ré, quer ainda Yazeed Al-Rajhi e Michael Orr puderam colocar-se nos últimos lugares do ‘top ten’. E neste caso, se o Can-Am Maverick T4 dos irmãos Ré é uma viatura com grandes limitações – nomeadamente em termos de velocidade máxima – já o décimo posto de Al-Rajhi ficou muito abaixo do que seria de esperar do piloto saudita que, claramente, deixou perceber que não se entende bem com a condução nos caminhos apertados e cheios de árvores do Alentejo. Das nove equipas portuguesas que andaram entre os dez mais rápidos, falta apenas referirmos uma: Pedro Dias da Silva e José Janela, que após a primeira etapa ocupavam o nono lugar, mas que na segunda começaram desde logo por perder duas posições, para no último troço caírem mais dois lugares; a Volkswagen Amarok do piloto de Tomar terminou na 13ª posição e foi o sétimo carro a exibir as cores portuguesas, atrás de um polaco, de três brasileiros e dois sauditas!
Duelo no grupo T3: vitória para Spranger e título para Nascimento
Em Portalegre, a prova da FIA foi ainda determinante para a consagração de Filipe Nascimento como vencedor do campeonato português do grupo T3 e o desafio do piloto de Cascais era meramente terminar, porque mesmo que fosse o último, nunca seria menos de terceiro, do ponto de vista de pontuações; e isso era mais do que suficiente para garantir o título. Terceiro à chegada, Nascimento marcou os 20 pontos do segundo lugar, pois à sua frente terminou um piloto espanhol que não concorria no nosso campeonato, o que lhe permitiu fechar a temporada com 89 pontos, mais nove que o adversário mais próximo.
E o principal adversário de Filipe Nascimento foi também o grande protagonista da corrida do grupo T3: David Spranger, que tal como Filipe Nascimento, também trocou de navegador para correr em Portalegre (o primeiro correu com o João Serôdio e Spranger com Sebastião Dominguez). Mais rápido no prólogo, Spranger atrasou-se bastante no segundo sector selectivo, o que o levou a descer do primeiro a último lugar deste grupo. Mas na segunda etapa, o Herrator HRX3 de Spranger e Dominguez impôs-se como o mais rápido no terceiro e quarto sectores selectivos. O abandono do CAN-AM XRS de Tiago Guerreiro e Pedro Santos, que estavam na liderança à partida do troço final, deixou David Spranger livre de oposição, permitindo-lhe não só recuperar a primazia, como assegura a vitória, a terceira consecutiva.
A Baja Portalegre 500 ‘nacional’ decidiu título T8
Disputada em simultâneo com a prova dos concorrentes que participavam de acordo com as regras da FIA, a corrida exclusiva para o Campeonato de Portugal de Todo Terreno AM|48 foi determinante para a atribuição do título de pilotos no grupo T8, decidida num duelo que opôs Ricardo Nascimento a Michael Braun e terminou com o sucesso do piloto do BMW X5 e do navegador do Porsche Cayenne do piloto austríaco, Ivo Santos.
À partida da Baja Portalegre 500 o campeonato do grupo T8 era ainda liderado pelos campeões em título, José Mendes e Jorge Batista, mas para renovar o ceptro, o piloto de Abrantes precisava que os seus adversários mais directos ficassem pelo caminho, porque mesmo que vencesse à frente de Ricardo Nascimento, conquistando ainda os três pontos adicionais pelo triunfo no três sectores selectivos, em bom rigor somente melhoraria 11 pontos ao seu total e, ainda assim, perderia por quatro pontos. E nem José Mendes conseguiu andar na frente, nem sequer terminou a prova, o que deixou a discussão do título entregue a Nascimento e Braun.
No final, Michael Braun e Ivo Santos saíram vencedores da Baja Portalegre 500, impondo o Porsche Cayenne como o mais rápido nos dois últimos sectores selectivos – os mais extensos de toda a prova, mas se isso foi suficiente para que Ivo Santos batesse Jorge Batista no campeonato reservado aos navegadores, não chegou para o título de condutores.
A Ricardo Nascimento bastou chegar em sexto – e em quarto do grupo T8 – para ganhar o título por quatro pontos de vantagem, já que dos cinco concorrentes que terminaram à frente do BMW X5, apenas o Porsche de Braun concorria consigo: dois tinham carros do grupo T1 e os outros dois, mesmo sendo do grupo T8, não estavam inscritos no campeonato, pelo que do ponto de vista de pontuações era como se não existissem, o que automaticamente converteu o quarto lugar de Nascimento num segundo posto, o terceiro que junto ao seu palmarés desta época, a que adicionou ainda uma vitória e um par de triunfos em sectores selectivos. Tudo somado, rendeu 87 pontos a Ricardo Nascimento, contra os 83 de Michael Braun que, de toda a maneira, encerrou o campeonato português com três vitórias e oito sucessos em sectores selectivos.
Assinale-se ainda que a prova nacional foi dominada no prólogo pelo Mercedes-Benz 350 SLC Coupé Proto X de Amândio Alves e Nuno Sousa, para no final da primeira etapa a liderança ser já protagonizada por Filipe Carvalho e Fábio Belo, num BRP Can-Am Maverick. Mas enquanto estes últimos desistiram na derradeira ‘especial’, Alves e Sousa asseguraram o terceiro posto final, a pouco mais de um minuto de Micael Cassiano e Rodrigo Fernandes, cuja Nissan Navara D22 ficou a quase 17 minutos do Porsche dos vencedores…
E relativamente ao grupo T2, depois da desistência da Isuzu D-Max de Georgino Pedroso e Carlos Silva logo no prólogo, somente a prova nacional contou com uma mão cheia de equipas. E desde o prólogo até ao arranque do sector selectivo final, a primazia foi monopolizada por Simão Comenda e Luís Dias, mas a Nissan Navara não resistiu aos últimos quilómetros e desistiu. O Dacia Duster 4WD dos polacos Michal Cebula e Mariusz Pietrzycki foi o único resistente deste grupo…
Taça de Portugal para Cesário Santos e Alexandre Gomes
Com sete equipas à partida – uma delas concorrendo a ‘solo’ – e quatro à chegada, a prova da Taça de Portugal foi totalmente dominada pela Nissan Navara D21 de Cesário Santos e Alexandre Gomes, que além da vitória, confirmaram igualmente os respectivos títulos, de pilotos e navegadores, fechando a época com quatro vitórias, em cinco provas! Como de costume, o percurso é mais curto para a Taça de Portugal, que em Portalegre incluiu o prólogo e o segundo e terceiro sectores selectivos, sempre ganhos por Cesário Santos e Alexandre Gomes, que foram também sempre secundados pela mesma dupla: José Maia e António Dias, igualmente numa Nissan Navara D21, que asseguraram ainda a segunda posição na Taça de Portugal, depois de somarem uma vitória, dois segundo e um terceiro lugares. O pódio em Portalegre completou-se com o Renault Mégane Proto de Júlio Mourão e Jorge Amaral, terceiros à chegada, por dois minutos de vantagem sobre o Nissan Terrano de Joaquim e João Calado.
Texto: Alexandre Correia Fotos: AIFA/Jorge Cunha/Albano Loureiro/A.C.