A Baja T.T. Dehesa da Extremadura é, sem dúvida, a prova de todo terreno onde os pilotos portugueses melhor se poderão sentir ’em casa’. O percurso segue através dos campos e montados na margem esquerda do Guadiana, entre Elvas e Mourão; ou melhor, entre Badajoz e Villanueva del Fresno, por cenários que em nada diferem dos que encontramos do lado direito do Guadiana, já em Portugal. Talvez isso ajude a explicar a facilidade com que os nossos pilotos rolam nestes troços: três dos quatro sectores disputados foi assegurada pelos portugueses, mas o triunfo final, o que realmente conta, foi desta vez garantido pelos espanhóis Félix Macias e José Luís Conde. A Toyota Hilux Overdrive desta dupla bateu por ‘um triz’ a Ford Ranger de André Amaral e Nelson Ramos, castigados por um furo que os atrasou no final…
As emoções foram fortes ao longo das três etapas desta edição da Baja T.T. Dehesa da Extremadura. Os pilotos portugueses, que dominaram nos anos anteriores, regressaram em força para reafirmar esse favoritismo. E as duas primeiras etapas terminaram com as equipas nacionais à frente da classificação. Os primeiros a liderar foram a dupla Edgar Condenso e António Pereira, que levaram a Ford Ranger turbodiesel a ganhar o prólogo, disputado nos arredores de Badajoz, junto a um braço do Guadiana.
Já na segunda etapa, em que apenas se cumpriram os dois primeiros dos três sectores selectivos previstos, as vitórias repartiram-se entre os dois lados da fronteira, cabendo o primeiro sucesso da jornada ao Mini Countryman X-Raid de Luís Recuenco e Sérgio Peinado, e o segundo à Toyota Hilux Overdrive de João Ferreira e João Serôdio. No entanto, uma extraordinária regularidade, em contraste com a generalidade dos adversários, permitiu que André Amaral e Nelson Ramos subissem ao comando após a segunda etapa, muito embora a sua Ford Ranger tivesse apenas obtido um terceiro e um sexto lugares nos dois troços.
À partida para a etapa final, com os derradeiros 105 quilómetros cronometrados, André Amaral dispunha de somente 20,8 segundos de vantagem sobre o Maverick X3 Turbo de Victor Grasa, que chegou mesmo a passar pelo comando, após o segundo sector selectivo. Atrás deste, arrancava a Toyota de João Ferreira, que contava apenas com um minuto de atraso relativamente ao comandante e que já tinha recuperado boa parte do tempo concedido numa paragem para trocar um pneu furado. Vencedor do terceiro sector selectivo, o jovem piloto de Leiria mantinha intactas as chances de discutir a vitória nesta Baja T.T. Dehesa da Extremadura. Daí que as emoções não podiam estar mais fortes quando a caravana arrancou pela última vez de Badajoz.
Lágrimas no final da Baja T.T. Dehesa da Extremadura…
Afinal, a última etapa não correu bem a nenhum dos favoritos e nem André Amaral conseguiu a primeira vitória absoluta da sua carreira, tal como poderia ter acontecido com João Ferreira e até mesmo com o espanhol Victor Grasa, que se vencesse, seria também o primeiro piloto a ganhar uma prova do campeonato de Espanha com um veículo do grupo T3. Grasa foi, precisamente, quem mais tempo perdeu na etapa final, pois se partiu em segundo, à chegada havia caído para o décimo posto, ao registar um atraso de quase um quarto de hora para o mais rápido.
A vitória no derradeiro sector selectivo foi obtida por mais uma equipa portuguesa: Henrique Silva e Henrique Damásio, que fizeram o Mini Paceman da Cattiva voar, para com este sucesso conseguirem uma inesperada e brilhante recuperação na classificação: trocaram o 12º pelo quinto lugar final, a apenas 9,7 segundos da equipa que terminou à sua frente e a quem ganharam de uma assentada mais de seis minutos. Quem os perdeu foi João Ferreira, que logo após o arranque do sector selectivo ficou parado, com o motor da Toyota Hilux a falhar, tal como já havia acontecido na partida do prólogo da prova anterior. E como se não bastassem os mais de dois minutos que se passaram até que o motor da Toyota voltasse a funcionar, João Ferreira arrancou pouco depois de ter passado por si o veículo que partia para o troço atrás de si; perseguiu-o durante quase todo o sector, acumulando o atraso.
Faltavam apenas 10 quilómetros para a chegada quando João Ferreira finalmente conseguiu ultrapassar os adversários – que tinham o sistema de aviso de proximidade de outro concorrente avariado e nunca se aperceberam da perseguição. Acreditamos que esses últimos 10 quilómetros tenham sido dos mais rápidos que João Ferreira percorreu; graças a isso, não foi alcançado na classificação pelo Mini de Henrique Silva. Mas se tivesse ultrapassado os seus adversários uns quilómetros antes, talvez tivesse mantido o terceiro lugar final, que perdeu para o Maverick X3 da dupla que tanto perseguiu – Santiago Navaro e Sergi Brugué – por apenas 15,7 segundos!
Do quinto ao primeiro lugar em 105 quilómetros…
Melhor dos concorrentes espanhóis na primeira etapa, Félix Macias terminou a segunda tirada em quinto e embora contasse com menos de dois minutos de atraso relativamente ao comandante, dificilmente conseguiria anular essa diferença em apenas 105 quilómetros. Da teoria à pratica, neste caso, a diferença foi total, pois a Toyota Hilux Overdrive de Macias nem precisou sequer de ter sido o mais rápido no derradeiro sector cronometrado para ganhar mais de três minutos a André Amaral e com isso obteve uma vitória incontestável, por um minuto e 28,2 segundos de avanço!
O desfecho desta Baja T.T. Dehesa da Extremadura não podia ter sido mais imprevisível. Aliás, não nos recordamos de uma prova de todo terreno disputada ao longo de três dias em que nos últimos quilómetros o quinto classificado tenha subido ao primeiro lugar, sem que qualquer dos adversários que o antecediam tivessem ficado pelo caminho. Não ficaram mesmo, mas facilitaram-lhe a vida, ou porque conheceram alguns problemas, que fazem sempre parte do ‘jogo’, ou apenas não conseguiram ser suficientemente fortes; foi o que sucedeu com Santiago Navarro, que mesmo assim, saiu para o final em quarto e terminou em terceiro. Seja como for, nada disso retira mérito ao triunfo de Félix Macias.
André Amaral e Nelson Ramos viram-se incapazes de contrariar este resultado depois de terem sofrido um furo, volvidos cerca de meia centena de quilómetros. O tempo perdido a trocar a roda à Ford Ranger foi irrecuperável mas, como se isso pudesse servir de consolação, o piloto de Barcelos jamais baixou os braços e o seu resultado soube-lhe a uma vitória. Talvez por ter sentido que, mais do que nunca, este sucesso, que ainda continua por alcançar, esteve à sua mão. E também porque lutou para andar na frente; não porque os adversários desistiram…
Já Victor Grasa, que era o segundo classificado no momento do arranque do sector final, desceria para a 10ª posição, a quase uma dúzia de minutos dos vencedores! Bastante atrasado na fase final foi também Luís Recuenco, que trocaria o sexto pelo nono lugar. E o piloto do Mini Countryman X-Raid só por nove segundos não desceu ainda mais um lugar, pois foi essa a vantagem final de Recuenco sobre Grasa.
Oitavos à saída de Badajoz, para a etapa final, Francisco Barreto e Carlos Silva regressaram ao centro da capital da Extremadura tal como partiram. Mas este resultado não deixa de ser animador para o piloto algarvio, que nunca terá andado tão próximo dos lugares da frente, como nesta Baja T.T. Dehesa da Extremadura. Basta observar que apenas um minuto e 12 segundos o separaram do…quarto lugar absoluto. Portanto, há que continuar a investir, que os treinos com o ‘professor’ Carlos Silva parece estarem a dar resultados positivos!
Portugueses só venceram grupo T2 e categoria ‘open’
Vencedores absolutos em 2020, quando, aliás, monopolizaram os três lugares do pódio, desta vez os pilotos portugueses somente trouxeram para casa a vitória no grupo T2 e na categoria ‘open’. Neste segundo caso, sublinhe-se, a concorrência era reduzida, mas se atendermos ao tempo total registado, o Porsche Cayenne Proto de Michael Braun e Ivo Santos teria somado este triunfo ao 12º posto absoluto, que lhes permitiria concluir a prova exactamente à frente dos primeiros líderes: Edgar Condenso e António Pereira.
Nas provas portuguesas, o Porsche Cayenne Proto de Michael Braun é inscrito no grupo T8, mas em Espanha os carros com estas especificações, que já não dispõem de homologação FIA válida, não podem competir ao mesmo plano que os T1/2/3/4, sendo relegados para uma prova de regularidade, em paralelo. Daí que o piloto austríaco, a residir em Portugal, tenha optado pela categoria ‘open’.
Mais discutida foi a primazia do grupo T2, que começou por ser liderado por Fernando Barreiros e Sérgio Cerveira. Logo na segunda etapa, a Isuzu D-Max desta dupla atrasou-se e então a Nissan Pick-up de Joel Marrazes e José Motaco adiantou-se, ao vencer o segundo sector selectivo. A partir daí, Fernando Barreiros ainda procurou recuperar, mas nem vencedor o terceiro sector, ficando mesmo à frente de Marrazes no troço final, foi suficiente para que as posições se invertessem. E ao ser o mais rápido na última etapa, o Toyota Land Cruiser de José Alberto Dorsch e Marcos Martinez garantiu o segundo posto em T2, ainda que tenha gasto mais um minuto e 12 segundos que a Nissan dos vencedores…
Texto: Alexandre Correia Fotos: Aifa/Jorge Cunha/A.C.