O caranguejo é o Can-Am de Alexandre Ré, que ficará para a história como o primeiro piloto a vencer uma competição de todo terreno em termos absolutos, ao volante de uma destas máquinas, do grupo T4. Alexandre Ré, acompanhado por Francisco Esperto, conduziu o caranguejo sem andar de marcha à ré, impondo um domínio quase absoluto na Baja de Loulé; foi a segunda prova do Campeonato de Portugal de Todo Terreno | AM48 e os vencedores bateram por quase seis minutos os adversários mais próximos…
Era apenas uma questão de tempo e Alexandre Ré sabia isso como mais ninguém: havia de levar à vitória em termos absolutos o seu caranguejo, como chama ao Can-Am Maverick X3 que se tornou na sua viatura de competição desde o início da temporada de 2020. O ano passado, isso nunca esteve realmente perto de acontecer, mas o facto de ter terminado todas as provas entre os primeiros bastou para deixar a ‘ameaça’ pendente.
Ao iniciar a temporada de 2021, Alexandre Ré trocou do grupo T3 para o T4, um pouco mais competitivo mas, ainda assim, com as mesmas limitações rigorosas que a regulamentação da FIA estabelece. Por exemplo, ao contrário dos SSV que competem em paralelo, sob a égide da federação de motociclismo, os que se regem pelas regras da FIA têm a velocidade máxima limitada a 130 quilómetros por fora.
A prova inaugural de 2021, a Baja T.T. Montes Alentejanos, não correu propriamente bem a Alexandre Ré, que se viu obrigado a desistir ao desfazer o cubo de uma das rodas, quando se preparava para enfrentar mais um sector selectivo. Volvidas apenas duas semanas, o piloto desceu até ao Algarve para conquistar, finalmente, a vitória que imaginava que, para acontecer, era apenas uma questão de tempo…
O caranguejo da dupla infalível: Vitória e Esperto…
Normalmente, Alexandre Ré, ou melhor, Alexandre Vitória Ré, costuma contar com o seu irmão João Pedro como navegador, mas desta vez a regra não se cumpriu: um compromisso para disputar um rali de clássicos impediu João Pedro de manter a dupla familiar, o que levou Alexandre a desviar para o seu lado o habitual navegador do seu companheiro de equipa, Gualter Barros. E é por isso que se junta a bordo do caranguejo uma dupla fantástica, que já parecia predisposta a vencer: Vitória e Esperto, Alexandre e Francisco, para sermos mais precisos.
Curiosamente, em 2019 tinha-se igualmente aberto uma excepção a esta dupla de irmãos, na Baja de Loulé e então Alexandre Ré discutiu a vitória absoluta praticamente até final. Ao volante de uma Volkswagen Amarok, o duelo que travou com a Toyota Hilux de João Ramos foi memorável. E nessa altura, Alexandre levou ao seu lado Hugo Magalhães, que agora foi chamado a ocupar o lugar deixado vago no Can-Am de Gualter Barros…
O mais curioso desta edição da Baja de Loulé é que Alexandre Ré e Luís Recuenco iniciaram a prova empatados. Nos seis quilómetros do prólogo, o caranguejo de Ré estebeleceu o sexto melhor tempo, que foi igualado pelo Mini Countryman de Luís Recuenco. A partir daí, o Can-Am esteve sempre à frente da prova, enquanto o seu adversário espanhol não mais deixou de o secundar. Após a primeira etapa, com um sector selectivo único de 157,23 quilómetros, a diferença entre ambos era de somente 41,5 segundos, que se ampliaram para cinco minutos, 55 segundos e três décimos, após a segunda etapa. Nesta última tirada, o percurso era praticamente igual, mas não se repetia um pequeno troço, reduzindo a distância para 142,08 quilómetros.
André Amaral e Nelson Ramos asseguraram terceiro lugar
Entre os dois primeiros, o duelo foi relativamente morno, já que Luís Recuenco e Sergio Peinado, claramente, não se mostraram dispostos a arriscar, mas sim a rolar com uma margem de segurança suficiente para não colocarem em perigo o segundo posto; e também para evitarem que a dureza do percursos provocasse danos no Mini. Nem que fosse nos pneus, pois as pistas tinham imensos troços bastante pedregosos, onde se registaram imensos furos…
Tiago Reis e Valter Cardoso, assim como João Ramos e Filipe Palmeiro, foram duas das equipas que não podiam deixar de correr riscos, já que ambos perseguem o campeonato e para andar entre os primeiros não podem fazer grandes concessões. Segundo e terceiros no prológo, onde ficaram separados por apenas 1,1 segundos, logo atrás da Ford Ranger de Nuno Madeira e Filipe Serra, João Ramos e Tiago Reis tiveram sortes bem distintas na prova, que cedo começou a correr mal.
Alinhando com a Toyota Hilux de Paulo Rui Ferreira, pois a sua nova pick-up ficou bastante danificada com o despiste que o fez desistir na Baja T.T. Montes Alentejanos, João Ramos já terminou o prólogo sem direcção assistida, nem travões. No curto período de assistência entre do primeiro sector selectivo, os mecânicos apenas tiveram tempo de substituir a direcção e deixar os travões de trás operacionais, mas não os da frente. Resultado: nestas condições, e a procurar compensar a enorme diferença entre esta e a sua Hilux, João Ramos ainda se sujeitou a mais riscos. E não só furou por duas vezes, perdendo bastante mais tempo do que era suposto, porque os macacos hidráulicos não funcionaram e a troca das rodas teve de ser feita recorrendo ao ‘método clássico’, de fazer subir à mão o macaco, como ainda acabaram por sair do caminho. A Toyota Hilux nada sofreu com o despiste, mas não conseguia voltar à pista pelos seus próprios meios. E valeu a Ramos e Palmeiro a generosa ajuda de André Amaral e Nelson Ramos, que por momentos ignoraram a corrida e pararam para rebocar os seus adversários. Já no final da segunda etapa, a escassos quilómetros da chegada, a Toyota de João Ramos voltou a sair da pista, numa altura em que os pneus já estavam de tal modo gastos que não tinham aderência. O piloto, para evitar capotar, apontou a Hilux de frente para uma ladeira, mas não conseguiu sair de lá sem ser rebocado. E desta vez, nenhum dos adversários o pôde ajudar, forçando-o a um abandono inglório, numa altura em que já estaria a discutir a sétima posição e, ao que tudo indicava, liderava a classificação do sector selectivo.
E quando empregamos a palavra ‘generosa’, é porque entendemos ser importante realçar gestos como os desta dupla, tanto mais que estavam empenhados na discussão dos lugares da frente: a Ford Ranger de André Amaral e Nelson Ramos foi a quinta viatura mais rápida no prólogo, mas terminaram a primeira etapa já ocupando o terceiro lugar, que reafirmaram na segunda jornada. Sempre perseguidos de perto pelo Mini Cooper D Proto de César e Tânia Sequeira, os homens da Ford sentiram bem forte essa pressão, sobretudo logo ao início do segundo sector selectivo. Ao fim de apenas cerca de uma trintena de quilómetros, a direcção da Ford começou a funcionar mal, sobretudo quando era preciso virar para a direita, o que chegou mesmo a fazê-los parar. O cronómetro, esse continuou a contar e o Mini dos Sequeira aproximou-se imenso, em todos os sentidos: num ápice o atraso da equipa de Portalegre, pai e filha, tinha-se reduzido a metade, ou seja, a pouco mais de um minuto. Mas André Amaral estava determinado em resistir e embora o problema tenha persistido até ao final, o esforço recompensou-o com um novo terceiro lugar, que teve um significado ainda mais forte para Nelson Ramos, pois esta foi a centésima prova do navegador algarvio!
Em Beja, na prova de abertura desta época, a nova Ford Ranger de André Amaral e o Mini de César Sequeira já tinham travado um renhido duelo. Agora, na repetição, também foi o piloto da Ford que saiu vitorioso, mas os seus adversários, que em Beja tinham ficado pelo caminho, desistindo já na parte final, desta vez seguiram até Loulé: César e Tânia Sequeira confirmaram o quarto posto absoluto por pouco mais de um par de minutos de atraso relativamente ao concorrente anterior, mas mais de quatro minutos de avanço sobre os quintos classificados…
Tiago Reis e Valter Cardoso permanecem à frente do CPTT
Terceiros no prólogo, colados à Toyota Hilux de João Ramos e Filipe Palmeiro, Tiago Reis e Valter Cardoso garantiram à chegada o quinto lugar, marcando mais 12 pontos que – somados aos 31 da vitória na prova anterior, no prólogo e em três dos sectores selectivos – bastaram para os manter na liderança do Campeonato de Portugal de Todo Terreno | AM48. Mas o certo é que esta Baja de Loulé esteve muito longe de correr bem aos campeões de 2019, pois ainda não tinham percorrido nem 30 quilómetros do primeiro sector selectivo e já a sua Toyota Hilux rodava com grandes limitações, devido à quebra da transmissão traseira. E depois, coleccionaram mais alguns contratempos…
Apesar de tudo, Tiago Reis e Valter Cardoso foram sétimos no final da primeira etapa e na segunda conseguiram melhorar mais duas posições, sem que jamais tivessem conseguido andar ao nível dos mais rápidos. No entanto, ficaram pelo caminho duas equipas que partiam à sua frente, o que, aliás, lhes facilitou a recuperação: a primeira delas foi o caranguejo de David Spranger e Jaqueline Ferris, um Can-Am Maverick X3 que liderou o grupo T3 até que, no início do segundo sector, a direcção abriu e tornou impossível que prosseguissem, quando eram os quartos classificados em termos absolutos! A segunda destas desistências eliminou o caranguejo de Gualter Barros e Hugo Magalhães, que não chegaram a meio do último sector, renunciando quando eram os quintos da classificação geral.
Quando esta dupla de Can-Am’s desistiu, Tiago Reis ainda era o sétimo classificado, mas como entretanto voltou a perder tempo, para chegar ao quinto posto, ainda teve de ultrapassar quer a Ford EXR05 Proto de Edgar Condenso, que desta vez teve ao seu lado António Serrão, quer ainda o Land Rover Bowler Proto de Lino Carapeta e Rui António.
Por coincidência, quer Condenso, quer Carapeta, protagonizaram grandes recuperações desde o prólogo, onde o primeiro sofreu um furo e o segundo um despiste, ficando relegados à partida para o 26º e 16º lugares. No final do primeiro dia de prova, Lino Carapeta e Edgar Condenso já ocupavam o oitavo e nono lugares, respectivamente, estando posicionados, precisamente, atrás do carro de Tiago Reis e à frente da Nissan Navara de Francisco Barreto. Este último, que no Algarve estreou a nova preparação da sua pick-up, que evoluiu para do grupo T8 para T1, fechava o lote dos dez primeiros, como que a confirmar a validade da opção por um nível mais competitivo; ao lado do piloto algarvio, está agora Carlos Silva, que foi ‘rendido’ a bordo da Isuzu de Georgino Pedroso por…Rui Sousa, enquanto o seu navegador das épocas anteriores, Sérgio Cerveira, passou a acompanhar Fernando Barreiros.
Na fase final da segunda etapa, tal como Tiago Reis recuperou até ao quinto lugar, também Edgar Condenso se adiantou aos adversários mais directos, para assegurar a sexta posição. Já Lino Carapeta viria a perder o sétimo posto para Francisco Barreto, que conquistou em casa o seu melhor resultado absoluto de sempre.
Vitória do grupo T8 decidiu-se nos últimos quilómetros
Em Loulé, o décimo posto absoluto coube a Ricardo Nascimento e Jorge Fernandes. Esta dupla venceu o grupo T8, mas o sucesso foi totalmente inesperado, pois até quase ao final da segunda etapa, foi o Porsche Cayenne Proto de Michael Braun e Ivo Santos que esteve na liderança. Um furo a apenas uma dúzia de quilómetros da chegada impediu-os de concluir a prova, abrindo caminho para o sucesso do BMW X5 de Nascimento que, curiosamente, até essa altura nunca tinha conseguido ser melhor que segundo, rodando sempre como que na sombra do Porsche. Mas do mesmo modo que conseguiram subir ao comando do grupo T8 mesmo sobre a linha da chegada, também nos quilómetros finais perderam uma posição em termos absolutos para o Bombardier X3 de Filipe e Maria Carvalho, que conseguiram o nono posto da classificação geral por apenas 25 segundos de vantagem!
Dos oito concorrentes que alinharam com viaturas do grupo T8, apenas metade concluiu a Baja de Loulé. E se teoricamente todos terminaram a primeira etapa, na verdade três deles foram desde logo excluídos, ao averbarem pesadas penalizações. Por isso mesmo, Henrique Lourenço e Ricardo Sobral, que tinham sido os mais rápidos T8 no prólogo, já não fizeram a Nissan Navara alinhar para a segunda etapa; tal como fizeram Nuno Tordo e João Serôdio, em Mitsubishi Pajero. Únicos ‘sobreviventes’ deste lote de penalizados, Rui Marques e Vitor Mendes persistiram até final, concluindo a Baja de Loulé no quarto posto do grupo, logo atrás do Toyota RAV4 de João Paulo Oliveira e Pedro Cação, bem como da Mitsubishi Strakar de José Mendes e Jorge Baptista. Graças a este segundo lugar, José Mendes e Jorge Baptista ascenderam ao comando do campeonato, nesta categoria, tomando uma posição estratégica para defenderem o título de campeões, conquistado em 2020.
Novo triunfo de Georgino Pedroso em T2…
Quase sem história foi a corrida dos cinco veículos que alinharam pelo grupo T2: do princípio ao fim, a primazia foi protagonizada pela Isuzu D-Max de Georgino Pedroso e Rui Sousa. E se Pedroso já está habituado às vitórias, o palmarés de Rui Sousa não menos rico nesta matéria, mas o antigo campeão nacional de todo terreno jamais tinha competido sem ser com o volante nas mãos. E na estreia como navegador, ninguém pode dizer que se tenha saído mal, pois venceram por 23 minutos de vantagem sobre a Nissan Navara de Joel Marrazes e José Motaco.
No prólogo, a vantagem dos vencedores foi de apenas três segundos, mas as perspectivas de um duelo com a Isuzu D-Max de Fernando Barreiros e Sérgio Cerveira goraram-se quando este se despistou, ainda na parte inicial do primeiro sector selectivo. O piloto absorveu o impacto com o corpo e acabou por ser evacuado de helicóptero para o hospital, em Faro, sob suspeita de lesões na coluna. Felizmente, os exames a que Fernando Barreiros foi sujeito, não revelaram nada de grave e na mesma noite já pôde receber alta. Mas a corrida, essa já tinha sido perdida…
Mais rápidos do grupo T8 por breves momentos, sem que não tivessem conseguido melhorar a sua posição, João Franco e Pedro Inácio fecharam o pódio do T2, mas a Nissan Navara destes jovens foi a última classificada do grupo. E em termos absolutos, atrás deles só ficam a Toyota Hilux dos seus maiores adversários no campeonato de 2020: João Ferreira e David Monteiro, que chegaram a rolar entre os mais rápidos de todos, mas que ao perderem uma roda ainda nos primeiros quilómetros do sector inicial, viram a sua corrida comprometida. E insistiram em competir até final, como se de um treino se tratasse, pois a experiência nunca será demais…
José Maia e António Dias dominaram na Taça de Portugal
Com cinco equipas à partida e apenas duas à chegada, desta feita a corrida reservada à Taça de Portugal não foi a mais discutida. Aliás, não foi mesmo nada discutida: no prólogo, a Nissan Navara de Cesário Santos e Alexandre Gomes adiantou-se a todos, batendo a Nissan de Micael Cassiano e Rodrigo Fernandes por uma dúzia de segundos. Mas no final do primeiro sector selectivo, José Maia e António Dias já levavam 52 minutos de avanço sobre o carro de Cassiano, enquanto o dos primeiros lideres era agora o último, atrás da Navara de José Pereira e André Martins, e do Nissan Terrano II de Ricardo Fiuza e Luís Coito.
A meio da segunda etapa, já somente restavam em prova José Maia e Ricardo Fiuza, que no final terminaram por esta ordem, com a vitória a ser assegurada por uma hora e 22 minutos de vantagem…
Texto: Alexandre Correia Fotos: Aifa/Jorge Cunha-A.C.-Vasco Mourão